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A ILUSÃO DO LIVRE-ARBÍTRIO

         Este artigo é parte de um trabalho maior sobre o Eneagrama que está sendo preparado para publicação. Outros textos poderão, eventualmente, ser destacados, quando envolverem aspectos fundamentais para a vida e não apenas para o Eneagrama.

      A vertente que utilizo nos meus estudos do Eneagrama se baseia no que poderia ser chamado de Leis Universais – energias nas quais estamos imersos e que mantêm o Universo em equilíbrio. Isto posto, é preciso fazer algumas ressalvas para que possamos seguir esse caminho com alguma chance de sucesso.

       Em primeiro lugar é necessário abdicar da ideia de que o Ser Humano é o centro de uma Criação que nenhum de nós sabe exatamente para o que serve. Para tal, é preciso nos situarmos como uma das muitas espécies existentes, o que pouquíssimos conseguem fazer. As Leis ou Energias que mantêm este Universo em equilíbrio não foram feitas para esta ou aquela espécie, mas sim para tudo o que existe. Existe, necessariamente, um processo de adaptação de todas elas a essas Leis, caso pretendam sobreviver. Não é sem motivo que a primeira Lei estudada e que dá partida aos processos humanos tem como suas forças principais a iniciativa, a criatividade e a versatilidade, requisitos fundamentais para promover uma adaptação ao mundo que nos cerca.

      Admitir isso, reconheça-se, não é fácil no tipo de cultura na qual transita o Ser Humano, pois ele se julga muito mais próximo do que ele chama de seu Deus do que realmente está. É preciso ter a humildade necessária para tentar conhecer que Leis são essas e como elas atuam, para poder, minimamente, lidar com elas e impedir que elas nos conduzam numa direção que, embora possa proporcionar equilíbrio ao Universo, o que aparentemente é o seu objetivo, não garante a sobrevivência de uma espécie. Este risco se torna maior quando a espécie dispõe de um intelecto capaz de levá-la a fazer escolhas que podem afastá-la de forma irremediável de sua finalidade que, por sinal, ela não conhece. Esta é a ilusão do “livre-arbítrio”, quando se julga que ele é irrestrito, o que só poderia ser verdade dentro dos limites impostos pela finalidade, se a espécie for, realmente, inteligente. Qualquer sistema, seja ele de que natureza for, ao se afastar do seu caminho projetado está fadado extinção, uma verdade que não precisa de grande esforço para ser constatada no próprio dia a dia de qualquer espécie. O que não é necessário não subsiste por muito tempo. Nada é criado ou pode se manter a não ser para atender a uma necessidade.

     Nenhuma espécie pode existir apenas para glorificar o seu criador, agradecer a sua existência, ou ter o direito de se achar com primazia sobre as demais, se não, o que seria daquelas que não conseguem fazer isso, por não disporem dos recursos intelectuais para tanto, pelo menos na nossa limitada percepção? Parece óbvio que tudo o que existe está aqui em decorrência de uma necessidade de contribuir de alguma forma para o conjunto da obra. Saber qual a contribuição a oferecer é que se torna o grande desafio, principalmente para aqueles sujeitos à ilusão do livre-arbítrio.

        O instinto dificilmente levaria uma espécie à extinção. Já, o livre-arbítrio...

      Uma das verdades que podemos experimentar ao longo de nossas trajetórias de vida com "livre-arbítrio" é a de que  as dificuldades aumentam à medida que consciência da realidade cresce. Basta pensar no cansaço ao final de uma jornada, de uma corrida ou de um empreendimento e que sempre nos apresenta a tentação de uma saída mais fácil, como parar ou desistir. A fase de livre-arbítrio parece ser uma etapa intermediária entre o “instinto inconsciente” e o “instinto consciente", este último frequentemente chamado pelos místicos de “iluminação”. Em ambos não há escolhas possíveis. No primeiro, a tônica é a sobrevivência; no segundo, só existe o cumprimento da finalidade.

     O Eneagrama que estamos estudando procura explicar como as Leis interagem entre si e com o Ser Humano permitindo – e aqui enfatizo o termo “permitir”, não “garantir” – que ele perceba com mais clareza a realidade na qual está inserido, caso esteja atento, isto é,  olhando para si mesmo dentro das situações. Ele poderia ser chamado de uma  ‘ferramenta de livre-arbítrio”.

       “Fazer”, efetivamente, alguma coisa é meramente uma questão de estar, ou não, consciente no momento da escolha. Mesmo o não fazer nada pode ser uma decisão válida, se tomada conscientemente e arcando com todos os riscos envolvidos. O objetivo de cada um deve ser o de aumentar os momentos de consciência, de presença efetiva, de vivência do agora. Nesses momentos, embora a polaridade possa existir, a mente só aceita uma opção, não há dúvidas ou preocupações no ato de escolher – não existe alternativa.

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